O Brasil está entre os maiores produtores de cacau do mundo. E a Bahia, em 2021, se manteve como a maior produtora de cacau do País, respondendo por 71,30% da produção nacional, o que representa 140.928 toneladas, segundo dados da Associação Nacional das Indústrias Processadoras de Cacau - AIPC.
Grande parte do cacau produzido na Bahia é cultivado no sul do Estado, onde a cacauicultura é uma cultura com mais de 200 anos de tradição, possuindo grande importância socioeconômica e cultural para as populações locais. Nessa região, foi desenvolvido um sistema específico de cultivo denominado cabruca, no qual o cacaueiro é plantado sob a sombra de árvores nativas da Mata Atlântica. Dessa maneira, cultiva-se mantendo a floresta em pé, além de contribuir para minimizar a incidência de pragas e melhorar a qualidade dos frutos. Tal forma de manejo faz com que o cacau produzido nessa região seja considerado um produto singular, com características próprias, reconhecido e apreciado pelo mercado nacional e internacional.
Nos últimos anos, em busca de qualificação produtiva, tem aumentado o número de produtores de cacau fino na Bahia. O aumento da produção de amêndoa de qualidade tem sido fomentado pela Tabôa, como estratégia de fortalecimento da cadeia de valor do cacau e de incremento da renda dos agricultores familiares, uma vez que a amêndoa de qualidade possui alto valor agregado. Por meio de seu Programa de Desenvolvimento Rural, a instituição tem investido no compartilhamento de conhecimentos, capacitações, acompanhamento técnico e acesso a crédito para famílias agricultoras da região - convencionais e agroecológicas - especialmente de assentamentos de reforma agrária.
Das 269 operações de crédito rural já realizadas pela Tabôa, 79,9% foram destinadas a investimento na cadeia de valor do cacau, seja no custeio do cacau, na implantação ou melhoria de sistemas agroflorestais com cacau, ou na produção de cacau de qualidade. As ações alcançam produtores convencionais, agroecológicos e em processo de transição. Nestes dois últimos casos, o acompanhamento técnico é realizado via Muká, uma plataforma de trabalho colaborativo entre Tabôa e Rede de Agroecologia Povos da Mata.
“A cacauicultura é uma vocação da região sul da Bahia e nós atuamos para fortalecê-la, valorizando a experiência e os saberes das comunidades locais. Ofertando acesso a crédito e acompanhamento técnico especializado, tem sido possível aumentar o número de agricultores produzindo cacau de qualidade, com uma melhoria significativa na renda familiar”, explica Gabriel Chaves, Gerente do Programa de Desenvolvimento Rural da Tabôa.
Segundo um levantamento feito entre os agricultores atendidos via plataforma Muká, considerando o período de 2019 a 2021, 50% das famílias atendidas já produzem cacau de qualidade. O incremento de renda por meio aumento da produção de cacau fino permitiu, por exemplo, minimizar os impactos das fortes chuvas que atingiram o sul da Bahia em 2020. (Relatório “Do solo ao prato”).
Cacau de qualidade - O cacau de qualidade, também conhecido como cacau fino, é caracterizado por um processo de manejo que começa desde a colheita dos frutos. Após uma criteriosa seleção, estes são despolpados, passam por um processo de fermentação no cocho, quando a levedura e as bactérias acéticas atuam transformando a polpa do cacau em álcool junto com gás carbônico. Em seguida, há produção de ácido acético, que matará o embrião da semente. Esse processo dura em média sete dias. Tatiane Botelho, Coordenadora do Eixo de Produção e Beneficiamento da plataforma colaborativa Muká, diz que “ao matar o embrião, aquele cacau que entrou no cocho deixa de ser uma semente, para ser uma amêndoa. É esse processo de fermentação que vai ativar os sabores e aromas característicos do cacau”.
Após o processo de fermentação, o cacau é posto para secar ao sol e é manejado periodicamente, como forma de diminuir a umidade das amêndoas. “A diferença mais clara (entre o cacau convencional e o cacau de qualidade) são as amêndoas. No cacau de qualidade, elas possuem uma coloração marrom, diferente do cacau bulk que apresenta coloração violeta. O responsável por essa amêndoa marrom é o processo de fermentação. E isso faz com que as amêndoas apresentem sabor adocicado, muito próximo ao sabor do chocolate 100%”, explica Rubens Dario, técnico de campo da plataforma Muká.
Da amêndoa ao chocolate - A qualidade da amêndoa do cacau tem um grande impacto também na produção do chocolate e seus derivados. Sem as informações sobre os benefícios desse processo, muitos produtores apenas secam as amêndoas ao sol, sem passar pela etapa de fermentação. Disso, resultam amêndoas com um sabor forte e menos palatáveis, o que, muitas vezes, leva à adição de açúcares e gorduras hidrogenadas, durante o processo de produção de chocolate.
A fabricação do chocolate artesanal, produzido com o cacau fino, ajuda a desfazer o mito de que apenas grandes indústrias podem produzir chocolate de qualidade, já que o processo, desde o beneficiamento do cacau até a produção do chocolate, se tornou mais acessível e recorrente entre os agricultores familiares na região. Alguns equipamentos também têm ajudado nesse processo, a exemplo da máquina Mélanger, um moinho responsável pela moagem e mistura do chocolate.
A Mélanger realiza funções de grande máquinas das indústrias, com um custo menor, permitindo a produção de chocolate artesanal por pequenos agricultores. “Então, isso é o diferencial, eu consigo produzir um cacau de qualidade com mais sabor e aroma. Hoje há marcas que fazem chocolate artesanal e que valorizam esse cacau, sem um custo alto. A gente não vende só cacau, a gente não vende só chocolate, a gente vende conceito, a gente vende história, a gente vende o que está por trás disso”, afirma Tatiane.